sexta-feira, 20 de abril de 2007

Big Brother Brasil: vigilância e (ir)realidade

Criado pelo holandês John De Mol e inspirado no livro 1984, de George Orwell, o reality show Big Brother aportou no Brasil em 2002 e consagrou-se já em sua primeira edição. O grande êxito do programa em terras tupiniquins é prova do alto grau de curiosidade dos brasileiros pela vida alheia, mas não se resume a isso: várias outras conclusões filosóficas e sociológicas podem ser feitas a partir desse fenômeno - entre elas a de que, ao assistir aos seus semelhantes, o que o telespectador busca é conhecer a si mesmo.

Depois de sete edições, o BBB parece ter encontrado uma espécie de “fórmula de sucesso”. Os personagens não têm profundidade e perpetuam estereótipos, correspondendo às expectativas da audiência acostumada com as telenovelas, formato que serve de inspiração para a estrutura narrativa do programa. O ambiente de confinamento acirra a competição e ajuda a criar um clima de melodrama, com romances e conflitos, ingredientes clássicos de toda trama folhetinesca que se preza. O tom de maniqueísmo é descarado: existem os “bons” e os “maus”, aqueles que manobram inescrupulosamente para conquistar poder entre os competidores e aqueles que parecem pagar pelos pecados da humanidade com seu coração aparentemente puro e sofredor.

Engana-se, porém, quem acredita piamente na autenticidade dos comportamentos dos competidores. Estando o tempo todo numa situação em que são espionados, mas não sabem quando nem por quem, os participantes da casa desenvolvem um comportamento peculiar: internalizam a vigilância como se ela estivesse ocorrendo 24 horas por dia, adotando os hábitos e a disciplina que julgam que deveriam exibir diante dos olhos de quem os vê. Essa subordinação inconsciente a um poder invisível é a perfeita tradução de como se comporta uma sociedade vigiada.

Nesse particular, é inevitável o paralelo com a alegoria do panóptico, usada por Foucault (1926-1984) em seu livro Vigiar e Punir, de 1975. Na obra, que investiga o desenvolvimento das relações de poder na transição do Antigo Regime para a sociedade capitalista, esse autor fala de uma solução arquitetônica (o panóptico) usada em casas de detenção do século XIX. As celas possuíam uma espécie de chaminé com uma abertura, por onde os guardas podiam vigiar os presos sem serem vistos. Dessa forma, por não saberem quando estavam efetivamente sendo vigiados, os detentos passavam a ostentar ininterruptamente a atitude que era esperada deles. Essa mesma distorção acontece dentro da mansão do BBB, onde os concorrentes ao desejado milhão de reais encenam diante das câmeras vorazes da Rede Globo os comportamentos esperados pela sociedade.

Portanto, cabe um questionamento: deixando-se de lado a exploração do grotesco, a exaltação voyeurística do sexo e a reafirmação de preconceitos, o que sobra de concreto no Big Brother Brasil ? Quanto efetivamente há de “realidade” nesse reality show ?

segunda-feira, 16 de abril de 2007

Em breve...

Em breve, postarei aqui um texto com as principais idéias que defendemos em nosso mini-seminário sobre o Big Brother Brasil.

E quando eu digo "em breve", entendam: "antes da prova de filosofia" :)

Aguardem!

sexta-feira, 13 de abril de 2007

Edgar Morin

Página dedicada à obra do sociólogo e pensador francês Edgar Morin. Biografia, bibliografia, agenda de eventos e acesso a textos do autor:

http://www.edgarmorin.sescsp.org.br

quinta-feira, 12 de abril de 2007

Humor

Um pouquinho de Freud, sempre!


quarta-feira, 11 de abril de 2007

Texto de apoio para o seminário

Big Brother Brasil: fabricação do cotidiano
Dissertação de mestrado de Renato Marcelo Teixeira de Menezes da Universidade de Marília.
Clique aqui para baixar

terça-feira, 10 de abril de 2007

terça-feira, 3 de abril de 2007

Passeio Socrático

Abaixo segue uma reflexão do Frei Beto sobre a sociedade de consumo. Ele usa como referências o nosso autor Jean Baudrillard e Sócrates. Se vocês quiserem podem acessar diretamente o link desse texto, mas acredito que essa reflexão é tão rica que deve constar no nosso blog também.
Consumo, logo existo
Ao visitar em agosto a admirável obra social de Carlinhos Brown, no Candeal, em Salvador, ouvi-o contar que na infância, vivida ali na pobreza, ele não conheceu a fome. Havia sempre um pouco de farinha, feijão, frutas e hortaliças. "Quem trouxe a fome foi a geladeira", disse.
O eletrodoméstico impôs à família a necessidade do supérfluo: refrigerantes, sorvetes etc. A economia de mercado, centrada no lucro e não nos direitos da população, nos submete ao consumo de símbolos. O valor simbólico da mercadoria figura acima de sua utilidade. Assim, a fome a que se refere Carlinhos Brown é inelutavelmente insaciável.
É próprio do humano - e nisso também nos diferenciamos dos animais - manipular o alimento que ingere. A refeição exige preparo, criatividade, e a cozinha é laboratório culinário, como a mesa é missa, no sentido litúrgico.
A ingestão de alimentos por um gato ou cachorro é um atavismo desprovido de arte. Entre humanos, comer exige um mínimo de cerimônia: sentar à mesa coberta pela toalha, usar talheres, apresentar os pratos com esmero e, sobretudo, desfrutar da companhia de outros comensais. Trata-se de um ritual que possui rubricas indeléveis. Parece-me desumano comer de pé ou sozinho, retirando o alimento diretamente da panela.
Marx já havia se dado conta do peso da geladeira. Nos "Manuscritos econômicos e filosóficos" (1844), ele constata que "o valor que cada um possui aos olhos do outro é o valor de seus respectivos bens. Portanto, em si o homem não tem valor para nós." O capitalismo de tal modo desumaniza que já não somos apenas consumidores, somos também consumidos. As mercadorias que me revestem e os bens simbólicos que me cercam é que determinam meu valor social. Desprovido ou despojado deles, perco o valor, condenado ao mundo ignaro da pobreza e à cultura da exclusão.
Para o povo maori da Nova Zelândia cada coisa, e não apenas as pessoas, tem alma. Em comunidades tradicionais de África também se encontra essa interação matéria-espírito. Ora, se dizem a nós que um aborígine cultua uma árvore ou pedra, um totem ou ave, com certeza faremos um olhar de desdém. Mas quantos de nós não cultuam o próprio carro, um determinado vinho guardado na adega, uma jóia?
Assim como um objeto se associa a seu dono nas comunidades tribais, na sociedade de consumo o mesmo ocorre sob a sofisticada égide da grife. Não se compra um vestido, compra-se um Gaultier; não se adquire um carro, e sim uma Ferrari; não se bebe um vinho, mas um Château Margaux. A roupa pode ser a mais horrorosa possível, porém se traz a assinatura de um famoso estilista a gata borralheira transforma-se em cinderela...
Somos consumidos pelas mercadorias na medida em que essa cultura neoliberal nos faz acreditar que delas emana uma energia que nos cobre como uma bendita unção, a de que pertencemos ao mundo dos eleitos, dos ricos, do poder. Pois a avassaladora indústria do consumismo imprime aos objetos uma aura, um espírito, que nos transfigura quando neles tocamos. E se somos privados desse privilégio, o sentimento de exclusão causa frustração, depressão, infelicidade.
Não importa que a pessoa seja imbecil. Revestida de objetos cobiçados, é alçada ao altar dos incensados pela inveja alheia. Ela se torna também objeto, confundida com seus apetrechos e tudo mais que carrega nela mas não é ela: bens, cifrões, cargos etc.
Comércio deriva de "com mercê", com troca. Hoje as relações de consumo são desprovidas de troca, impessoais, não mais mediatizadas pelas pessoas. Outrora, a quitanda, o boteco, a mercearia, criavam vínculos entre o vendedor e o comprador, e também constituíam o espaço das relações de vizinhança, como ainda ocorre na feira.
Agora o supermercado suprime a presença humana. Lá está a gôndola abarrotada de produtos sedutoramente embalados. Ali, a frustração da falta de convívio é compensada pelo consumo supérfluo. "Nada poderia ser maior que a sedução" - diz Jean Baudrillard - "nem mesmo a ordem que a destrói." E a sedução ganha seu supremo canal na compra pela internet. Sem sair da cadeira o consumidor faz chegar à sua casa todos os produtos que deseja.
Vou com freqüência a livrarias de shoppings. Ao passar diante das lojas e contemplar os veneráveis objetos de consumo, vendedores se acercam indagando se necessito algo. "Não, obrigado. Estou apenas fazendo um passeio socrático", respondo. Olham-me intrigados. Então explico: Sócrates era um filósofo grego que viveu séculos antes de Cristo. Também gostava de passear pelas ruas comerciais de Atenas. E, assediado por vendedores como vocês, respondia: "Estou apenas observando quanta coisa existe de que não preciso para ser feliz".
(Por Frei Beto)